domingo, 12 de fevereiro de 2012

MORADORES DE RUA ENCONTRAM ABRIGO EMBAIXO DE CANAL DO BALDE

 (Fábio COrtez/DN/D.A. Press)
Como morcegos em grutas escuras, úmidas e sombrias. Assim vive, debaixo do canal do Baldo, um grupo de pessoas pobres, numa realidade de desemprego, ausência de domicílio, renda fixa ou família. Acabam se tornando irmãos de sangue na vida infeliz que dizem levar. Com o pouco dinheiro que ganham para sobreviver através da coleta de materiais recicláveis pelas ruas da capital potiguar, os mendigos compram apenas comida, item básico para sobreviverem.

Inácio Alves da Silva, de 36 anos, é um deles. Desde os seis anos de idade morando nas ruas, sozinho, a intimidade com as ruas o torna um herói de si mesmo. Quando criança, o morador de rua encarou um momento muito difícil na sua terra natal, Baraúna, no Alto Oeste potiguar. Um incêndio de altas proporções acometeu a sua família inteira: pai, mãe e um irmão mais novo, de dois anos de idade, foram vítimas fatais. Só sobrou Inácio que levado para um orfanato de onde fugiu pouco tempo depois.

"Desde pequeno eu soube me virar. Lá em casa a realidade não era muito fácil e eu como filho mais velho já ajudava meu pai nas tarefas diárias, para mantermos o lar. Depois que eu fiquei sozinho no mundo, eu precisei aprender muita coisa sozinho, mas sempre tive o apoio de Deus nessa corrida", afirma o mendigo. Catando latas e plásticos que lotam uma sacola gigante branca, Inácio caminha boa parte de Natal atrás de encontrar esses materiais que ninguém quer, mas que para ele simbolizam o pão de cada dia.

"É barato o quilo desses materiais. O plástico é R$ 0,40 e o metal é R$ 0,30. Então a gente tem que catar muito, muito mesmo", frisa. "Faço pouco mais de R$ 5 por dia, se eu tiver muita sorte", completa, enquanto come um pedaço de melancia. Segundo ele, no total 12 pessoas compartilham aquele espaço sobre o canal do Baldo. Quando chove, todos se deslocam para o centro da Cidade, em busca de alguma marquise que possa livrá-los da chuva intensa, uma vez que as águas do canal sobem e ocupam o paredão onde os mendigos ficam.

José Gomes, 43, é outro que mora no mesmo local. "Aqui há espaço para as pessoas que precisam. É público e não precisa pagar pedágio", diz. Há nove anos nas ruas, o sem teto afirma que escolheu morar nas ruas depois que perdeu a sua esposa, em São José do Campestre, vítima de um câncer. A dor da perda provocou mudanças vertiginosas no comportamento do homem que, sem casa própria, veio para a capital e não conseguiu curar a ferida da saudade da esposa.

"É bem difícil essa vida, ainda mais sozinho", disse o homem de poucas palavras. Aguardando que outras águas, que não sejam as águas do esgoto do Baldo, guiem a sua vida, José espera na penumbra que uma luz acenda o seu caminho. Alegando não receber auxílio algum e que nenhuma visita de órgãos públicos acontece, o morador de rua alerta para a precariedade do serviço de assistência social aos desabrigados das ruas potiguares. "Da parte deles é difícil que alguém nos estenda a mão".

Semtas apresenta trabalho de busca ativa

Operacional. É assim que justifica o titular da pasta da Secretaria Municipal de Trabalho e Assistência Social (Semtas), Alcedo Borges, com relação aos trabalhos de busca ativa e cadastramento de desabrigados que necessitem utilizar o Albergue Municipal para pernoitarem, fazem a higiene pessoal e alimentarem-se pela manhã e à noite. "Temos ido atrás dessas pessoas que necessitam do auxílio do poder público para se reerguerem da sua situação de miséria. Isso é contínuo", garante Alcedo Borges.

Segundo o secretário de trabalho e assistência social de Natal, as avaliações são feitas caso a caso, sem ferir o direito de ir e vir dos cidadãos. "Só agimos com determinação judicial em caso de apresentarem menores em situação de risco e fazemos o cadastro apenas das pessoas que realmente necessitem desse apoio social, já que muitos desses moradores possuem casa própria em bairros carentes da cidade", alega.

Alcedo relembrou o recente caso da remoção de 16 famílias na Avenida das Alagoas, quando foram descobertas 10 famílias que vinham do interior do estado e que possuíam residência, quatro famílias do bairro Leningrado, zona Oeste de Natal e apenas duas famílias viviam, de fato em situação de rua. Quando constatada a situação de rua, as pessoas são encaminhadas ao Albergue Municipal para serem receberem auxílio e até mesmo ressocialização, através de cursos e a apoio psicológico. Considerando os moradores de rua do canal do Baldo, Alcedo disse que tomará as devidas providências e que novas equipes deverão visitar o local.

Em conversa com Priscila Dantas, diretora do departamento de Proteção Especial da Semtas, a reportagem registrou que o Centro de Referência Especializada no Atendimento à População em Situação de Rua está funcionando a todo o vapor na avenida 25 de dezembro, na Praia do Meio. "O Centro POP, como é conhecido, está com um trabalho bonito de ressocialização, onde são feitos encaminhamentos para saúde e educação e até mesmo na tentativa de renovar os vínculos dessas pessoas de rua que foram perdidos com asfamílias ao longo de todos esses anos afastados".

A diretora conta que uma parceria com a Facex permitirá contabilizar a número de pessoas em situação de rua na cidade de Natal e também traçará o perfil dos desabrigados. "Essa é uma busca pelo viés qualitativo dessas pessoas que sobrevivem nas ruas natalenses".

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